sexta-feira, 15 de junho de 2012

DELIRIO


Depois de ouvir o decreto, um homem franziu os olhos como se uma acidez o tivesse tomado. O que seria daquelas pessoas sem seus delírios e afetos?

CLARA

Ao ouvir esta pergunta, Clara que estava de pé, se encostou na parede assustada. Ela temia que a alegria fosse de vez banida daquele lugar, que a esperança e a inocência desaparecessem. Elas eram alegres, podíamos ver isso nos imensos arranjos de flores que colocavam no chapéu. O primeiro ministro se aproxima de Clara para tentar conter seu espanto. Naquele bar ninguém mais poderia sentir nada.

CORTE

Na autópsia não foi constatado a dilatação do coração, como havia dito o príncipe que as conheceu. Ele as via por meio de um coração atrofiado, todos sabiam disto. Mas o delírio que as envolvia, e a intensidade da amizade entre elas, fazia mal aquele que carregava no peito um coração emagrecido.

BAR

Em outra parte da cidade havia um bar. Os casais do lugar se encontravam ali, a realeza não escondia o desdém sobre aquele café onde se ouvia gargalhadas fartas. Muitos comentavam sobre o que teria levado aquelas mulheres a morte, porque seus corpos foram tão severamente investigados? Do outro lado do bar uma mulher solta um riso longo, e pegunta: "vocês não sabem?"

LUCIO

Quando Lúcio soube do novo decreto foi tomado por um torpor. A vertigem que o acometida tinha seus motivos, ele não conseguiria viver sem amar, precisava dos afetos para se vincular. O sexo não lhe bastava. O primeiro ministro foi categórico: " desta data em diante, o príncipe decreta que qualquer manifestação de afeto será considerada crime, a não ser que sejam dirigidos para ele."

ALEGRIA


Ela havia acabado de colocar ponto final em uma série de encontros que aguavam qualquer possibilidade de amor. Os que sabiam disto a chamaram de desvairada. Ela retrucou dizendo que não, se dizia doente por ter se apaixonado por alguém com o coração atrofiado, e comentou: se estivesse louca teria partido mais cedo, pois a paixão é o outro em nós, e em mim só existia eu mesma. A alegria explodiu iluminando todo salão.

INQUIETUDE.

Esta inquietude que me consome e me faz andar entre renegados e esquecidos, se mantém na acidez de minha pele, no cheiro de enxofre que exalo. Solitário, resta-me ter o prazer por companhia, ele que abranda esta maldição de ser um dos filhos de D-us. 

As asas que ganhei não são suficientes para aliviar o peso que carrego de ser eu, e apenas eu, aquele que consegue ler a si mesmo.

MEU AVÔ



Meu avô veio para o Brasil para escapar de uma guerra. Certa vez perguntei a ele se era o amor que fazia as pessoa viverem, ao que ele me respondeu: as pessoas vivem não porque sentem amor a vida, se assim fosse a deixariam melhor do que a encontraram. Elas vivem porque não encontraram coisa melhor para fazer, e o suicido não lhes pareceu uma alternativa convincente. 
Eu gostava de conversar com meu avô.